Chega dezembro, e nada me motiva para o espírito natalício que sinto acontecer à minha volta. São as montras repletas de decorações, as luzes das iluminações das ruas, e a feira de natal que se enche de gente. Nada disto me anima e quase me irrita. Mas é natal, dizem-me, como se isso bastasse para me alegrar.
Chego assim ao dia 16 de dezembro, em que decido que tenho mesmo de fazer algumas compras obrigatórias.
Saio cedo, pois não me apetece andar em lojas repletas de gente, com sacos cheios, a esbarrar em tudo e todos, e a desejar bom natal quer nos conheçam quer não.
Já na rua, apercebo-me de um desfile de crianças que, vindas de escolas e colégios do concelho, enche por completo a nossa Rua da Sé.
Vejo os olhinhos dos pequeninos a brilharem nos seus fatinhos de pai natal, e até vejo o Tomé, meu sobrinho bisneto, vestido de S. José, a abrir o grupo do seu colégio. Lindo o “meu” Tomé. Chamo-o, digo-lhe que está lindo, presenteia-me com um lindo sorriso, e segue muito compenetrado do seu papel, já que o seu personagem não é para brincar… Mas, eis que atrás deles surge uma cadeira de rodas disfarçada de manjedoura, que transporta uma criança, provavelmente com paralisia cerebral, mas que, no seu papel de Menino Jesus, demonstra uma alegria imensa. Nossa Senhora e S. José, vestidos a rigor, empurram pacientemente a manjedoura, por vezes ajudados pela professora, pois a irregularidade do piso a isso obriga.
À medida que os olho, as lágrimas toldam-me a visão e disfarço mesmo as que teimam em cair. A razão ninguém adivinharia… Afinal o natal está ali à minha frente. Afinal o natal é exatamente a alegria daquela criança que, não fosse a vontade e imaginação dos seus professores, estaria, no máximo, na sua cadeira de rodas a ver os coleguinhas a desfilarem. E eu, que direito tenho de andar a “fazer birra” para não sentir o “espírito de natal”, se posso percorrer as ruas e entrar nas lojas que quiser, sem necessitar da ajuda de ninguém? Que direito tenho de não querer viver a alegria do natal, quando posso abraçar quem quero, bastando para isso a vontade de abrir os braços? Que direito tenho de não vibrar com as luzes das ruas e das janelas das casas, quando são colocadas com o objetivo de fazer feliz quem por lá passa?
Naquele instante quase me envergonhei de mim própria. Segui em frente, entrei em lojas, comprei prendas, abracei pessoas, e porque a chuva teimou em me acompanhar, senti-me uma Gene Kelly no filme Singing in the rain.
Voltei a casa carregada de sacos, coloquei as estrelas de luzes nas janelas, decorei a árvore de natal, e fiz as bolachinhas que deixaram a casa com o aroma de especiarias, de que tanto gosto.
Obrigada professores da escola cujo nome não sei. Obrigada por me terem mostrado a “crença” em que me tinha fechado. Obrigada por me terem feito perceber que tenho que dar graças por tudo o que tenho e sou, e que a forma de o fazer, nesta altura, é viver a minha e a felicidade dos outros. Bem hajam por isso.
Votos de um bom natal, e que o ano de 2023 nos traga a esperança da paz que tanto ansiamos.
Ana Toste
Chego assim ao dia 16 de dezembro, em que decido que tenho mesmo de fazer algumas compras obrigatórias.
Saio cedo, pois não me apetece andar em lojas repletas de gente, com sacos cheios, a esbarrar em tudo e todos, e a desejar bom natal quer nos conheçam quer não.
Já na rua, apercebo-me de um desfile de crianças que, vindas de escolas e colégios do concelho, enche por completo a nossa Rua da Sé.
Vejo os olhinhos dos pequeninos a brilharem nos seus fatinhos de pai natal, e até vejo o Tomé, meu sobrinho bisneto, vestido de S. José, a abrir o grupo do seu colégio. Lindo o “meu” Tomé. Chamo-o, digo-lhe que está lindo, presenteia-me com um lindo sorriso, e segue muito compenetrado do seu papel, já que o seu personagem não é para brincar… Mas, eis que atrás deles surge uma cadeira de rodas disfarçada de manjedoura, que transporta uma criança, provavelmente com paralisia cerebral, mas que, no seu papel de Menino Jesus, demonstra uma alegria imensa. Nossa Senhora e S. José, vestidos a rigor, empurram pacientemente a manjedoura, por vezes ajudados pela professora, pois a irregularidade do piso a isso obriga.
À medida que os olho, as lágrimas toldam-me a visão e disfarço mesmo as que teimam em cair. A razão ninguém adivinharia… Afinal o natal está ali à minha frente. Afinal o natal é exatamente a alegria daquela criança que, não fosse a vontade e imaginação dos seus professores, estaria, no máximo, na sua cadeira de rodas a ver os coleguinhas a desfilarem. E eu, que direito tenho de andar a “fazer birra” para não sentir o “espírito de natal”, se posso percorrer as ruas e entrar nas lojas que quiser, sem necessitar da ajuda de ninguém? Que direito tenho de não querer viver a alegria do natal, quando posso abraçar quem quero, bastando para isso a vontade de abrir os braços? Que direito tenho de não vibrar com as luzes das ruas e das janelas das casas, quando são colocadas com o objetivo de fazer feliz quem por lá passa?
Naquele instante quase me envergonhei de mim própria. Segui em frente, entrei em lojas, comprei prendas, abracei pessoas, e porque a chuva teimou em me acompanhar, senti-me uma Gene Kelly no filme Singing in the rain.
Voltei a casa carregada de sacos, coloquei as estrelas de luzes nas janelas, decorei a árvore de natal, e fiz as bolachinhas que deixaram a casa com o aroma de especiarias, de que tanto gosto.
Obrigada professores da escola cujo nome não sei. Obrigada por me terem mostrado a “crença” em que me tinha fechado. Obrigada por me terem feito perceber que tenho que dar graças por tudo o que tenho e sou, e que a forma de o fazer, nesta altura, é viver a minha e a felicidade dos outros. Bem hajam por isso.
Votos de um bom natal, e que o ano de 2023 nos traga a esperança da paz que tanto ansiamos.
Ana Toste
Lindo texto! bjs e que o espírito de Natal permaneça sempre nos nossos corações ❤️🌲
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