Avançar para o conteúdo principal

INTERRUPÇÃO NÃO PROGRAMADA

NOVA IORQUE PELOS OLHOS DA FILHA

Antes de mais, um ALERTA: é nas mais pequenas coisas que falhamos porque é humanamente impossível estar vigilante e premeditar todos os nossos movimentos e por isso, uma máscara bem colocada, uma constante limpeza das mãos, podem fazer toda a diferença!

28 novembro – a minha mãe pede para olhar para o meu pai e diz que ele não está bem;

28 novembro – de facto, semblante carregado, dores no corpo e saturação de oxigénio a 86 não seria normal só porque sim;

28 novembro – pai, tens COVID! Oh que exagerada! 

Fui embora. O meu pai desceu comigo com as indicações de tomar um analgésico nesse dia e no seguinte. “Mãe, liguem para a Saúde 24 sff! 

1 dezembro – resultado positivo à Sars-COV-2. 

Pai isolado no quarto com possibilidade de ter um WC só para seu uso. Mãe em isolamento profilático – dependente da ajuda da filha para lhe fazer chegar comida, pão, colocar o lixo na rua, resolver coisas (porque a vida não pára). 

Todos os dias fui a casa dos meus pais. Antes da COVID ia pelo menos ao fim de semana. Fui todos os dias – TODOS! Continuei as minhas jornadas de 8h diárias em teletrabalho como já estava, continuei a ter as minhas tarefas de casa, continuei tudo, inclusive prestar apoio a outra casa. 

Hoje está melhor. Hoje está pior. Quando já nem conseguia vir à janela para me dizer adeus, percebi que algo não estaria bem. Não estava a recuperar e de facto não estava. 

8 dezembro – entrada na área COVID-19 no Centro Hospitalar e Universitário São João. 

9 dezembro – “filha não te liguei porque o pai esteve lá e vai ficar internado! Preciso que vás lá, mas passa aqui por casa primeiro por favor!” Cai o chão, o mundo, o teto, os sonhos, os desejos, a esperança… 

9 dezembro – entro pelo CHSJ para saber novidades do meu pai, entrei hipervigilante: onde toco, desinfetante em riste, uma luva por causa de um corte numa mão, duas máscaras! Obrigada a todos e a todas com quem me cruzei. Pelo humanismo. 

1ª informação: passou da área covid para a “ginecologia” que passou a albergar doentes covid. Não posso deixar nada a não ser os carregadores de telemóvel, máquina barbear e um par de chinelos. Até aqui, entendo. Regresso a casa da minha mãe. Venho para a minha para almoçar. Sim, porque no hospital devo ter demorado pelo menos umas 4 horas. Assim que retiro toda a roupa que usei no hospital, recebo uma chamada:” filha vai ao hospital que o pai passou para os Cuidados Intensivos e não pode ter nada.” Anoto as indicações, visto-me novamente e rumo ao hospital. Novamente, com quem me cruzei, foi humano e ouviram da minha boca por diversas vezes um obrigada sentido e já sem esperança.  Se antes caiu tudo, neste momento, coloco TUDO em perspetiva. 


Rezei. Rezei. Pelo meu pai que a 20 de dezembro regressou a casa. Rezei pelos médicos, enfermeiros, auxiliares, pessoal que das mais variadas formas intervém em todos os processos para que tudo funcione. Rezei por mim. Rezei por todos os doentes COVID e não COVID.


Rezei. Rezo. E Rezarei.


mjsoares


Comentários

Mensagens populares deste blogue

A MINHA VIAGEM AO JAPÃO

Verdade, fui ao Japão. Verdade, aventurei-me a, depois de 2h30 de viagem para Lisboa, meter-me num outro avião para, durante 7h30, fazer Lisboa-Dubai, e ainda noutro para mais 9h30 até Tóquio. Ainda hoje me pergunto como me aventurei a tal, eu que me arrepio sempre que se fala em viagens de avião. Mas fi-lo e ainda bem!   O Japão nunca foi um país que me despertasse grande interesse, logo uma viagem que, não fosse a minha amiga Manuela, provavelmente não teria feito. Por diversas vezes já lhe agradeci e vou sempre agradecer-lhe ter-me ligado, naquele dia, a dizer-me “… vamos?” Mas, se nada é por acaso, é porque agora é que era a altura certa para a fazer, pois a idade já me permitiu uma plenitude que antes não alcançava. Já regressei há vários dias e ainda não “aterrei” no meu quotidiano. Continuo, a cada minuto, a visualizar imagens, paisagens, gestos e atitudes que me levam ao que, agora, considero um outro mundo. Um outro mundo em que é notório o respeito pelo outro, nomead...

A ARTE, A BELEZA E A GRATIDÃO

  Sou frequentadora assídua da Confeitaria Paulista na Maia, onde a D. Elvira e o Sr. Jorge Mendes (proprietários), fazem questão de nos receber de “braços abertos.” Tomo o meu café e pão com manteiga neste maravilhoso espaço. É um local muito familiar. Um espaço onde nos sentimos muito bem!!!  Somos bem recebidos; Bem tratados; Bem-vindos!!! Sentimo-nos em casa. A D. Elvira faz questão de nos fazer sentir únicos. Há uns dias, tive oportunidade de ver uma autêntica obra de arte saída das mãos do proprietário da Confeitaria Paulista. Trata-se da peça cuja fotografia está a ilustrar esta publicação. Ao ter acesso ao dito quadro, acreditem, que senti ARTE, que senti BELEZA e depois de saber a história que o envolve, senti que ali, existia GRATIDÃO.  Ora o Sr. Jorge Mendes, decidiu pôr mãos à obra e fazer este maravilhoso trabalho em pão. Sim, trata-se de pão e não outro material qualquer. Explicou-me as múltiplas e morosas voltas que este trabalho dá, até chegar ao resultado...

A LOUCURA DO MUNDO

  Tinha decidido que hoje escreveria de novo sobre a minha viagem ao Japão, e que vos contaria algumas peripécias dignas de registo humorístico, daquelas que sempre me acontecem e me divertem ao ponto de querer partilhar com outros, e porque me faz feliz. Faz-me feliz fazer aparecer um sorriso no rosto de quem lê os meus textos, um sorriso que muitas vezes anda escondido e tarda em aparecer. No entanto, nem sempre isso é possível, e hoje não pode ser assim. Hoje tenho de partilhar convosco a minha tristeza, a minha revolta, a minha frustração. Desculpem-me mas terá de ser assim. Logo pela manhã, como habitualmente, abri o rádio para me atualizar acerca do que se passa no nosso país e para além dele, e o que fui ouvindo fez-me decidir que não concluiria o meu texto nos termos em que tinha pensado. Não tinha esse direito perante o que estava a ouvir. Se o fizesse era como se também estivesse a assobiar para o lado perante o horror que me descreviam. Apesar de ser uma peça insignifica...