Não resisto a escrever sobre o natal, porque a cada dia que passa me apercebo do quanto era diferente o meu natal, num tempo em que tudo para mim era magia e felicidade, num tempo em que me bastava olhar o meu pai e a minha mãe para me sentir a pessoa (criança) mais rica e mais feliz do mundo.
Éramos uma família simples, de uma freguesia rural, daquelas em que a mãe cuidava das lides domésticas, e o pai, nestes dias, regressava a casa tarde, pois aproveitava para vender um pouco mais e, por isso, fechava a “mercearia” de que era proprietário, na cidade, bastante mais tarde do que o habitual.
Na noite de natal, o pai trazia nozes, figos e deliciosos chocolates Regina, em forma de coração e de guarda-chuva. De os lembrar, quase salivo. Não havia televisão, e música só a que o Rádio Club de Angra emitia, à qual acho que ninguém prestava grande atenção. Não havia presentes embrulhados pelas mãos das meninas das lojas, de forma impessoal. Não havia muitas iguarias a encher a mesa que aguardava a chegada do pai. Mas havia uma mãe que nas semanas que antecediam o natal se sentava, ao serão, comigo, na mesa da cozinha, a recortar “casinhas” em cartolina, que seriam colocadas no presépio que seria feito com fetos e “leivas”, que iriamos recolher ao “mato”, fazendo desse momento uma verdadeira festa. E havia um pai, que ao chegar a casa me sentava ao colo e contava histórias que me deliciavam, e que, a meu pedido, as repetia vezes sem conta, sem nunca denotar o cansaço que provavelmente tantas e tantas vezes sentia. Havia também canja de galinha, a melhor canja do mundo, aquela que só a mãe sabia fazer.
E acreditem ou não, ao recordar estes natais, aqueles que eu gostaria ainda de viver, dou conta de que não há um único presente que me tenha marcado e de que me lembre. Não acredito que não os houvesse, por mais simples que fossem, mas tudo o resto suplantava o material. O que relembro com uma saudade imensa, é a serenidade e o carinho da mãe, a alegria contagiante do pai, o mimo dos irmãos mais velhos, o companheirismo dos sobrinhos (da minha idade) e amor, muito, muito amor.
Quem dera todos pudessem recordar natais como estes. Quem dera todos pudessem ter sentido o toque suave das mãos de uma mãe e de um pai como eu senti. Quem dera todos pudessem ter sentido um dia que eram ricos, sem nada ter, para além do que o seu pequeno mundo de freguesia rural lhe mostrava.
Por tudo isto e por aquilo que as palavras não conseguem descrever, fui uma felizarda, tive dos melhores natais do mundo e devo-os aos meus pais, seres maravilhosos que já não estão presente fisicamente, mas que me acompanharão para todo o sempre. Para eles uma única palavra me ocorre: OBRIGADA!
Ana Toste
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