Avançar para o conteúdo principal

MERCEDES?

DECLARAÇÃO DE AMOR EM TEMPO DE COVID-19

Olá meu amor.

Sempre pensei que Deus nos ajudasse aos dois, e ao nosso núcleo familiar, a passar ilesos por esta pandemia.

Mas tal não aconteceu e tu foste infectado sabe-se lá por quem e onde.

E estás confinado ao nosso quarto há já uma semana. 

Sabes, tens sorte em o nosso quarto ser uma suite, assim podes viver aí dentro sem daí nunca saíres. Soa mal dizer isto. Parece que estás numa prisão. E estás. Estás retido dentro dessas paredes e estás privado de ir à rua passear, de ir trabalhar, de jantar na sala, de estar connosco. Com os teus netos.

Tens unicamente como companhia a tua própria pessoa. Tens todo o tempo do mundo para pensar, para ver televisão, para ler o jornal que todos os dias eu te entrego.

Mas nada disso tu fazes. Limitas-te a estar sentado no sofá ou deitado na cama, de olhos fechados, a sofrer sozinho este isolamento. 

E é isso que me dói. Ver-te tão sozinho, tão triste. Choro em silêncio pelo resto da casa onde tu não andas. Falo comigo própria para exteriorizar a raiva que me vai cá dentro por não termos conseguido evitar este contágio. Sofro à noite quando me deito noutra cama, noutro quarto. 

Não posso sentar-me na cama ao teu lado a conversar. Nem sequer ficar em pé para te dar ânimo. 

Entro e saio rapidamente do quarto para te colocar em cima da mesa o tabuleiro com as refeições que tu fazes sozinho e com muito custo, sendo essa falta de apetite e enjoos sintomas da Covid-19.

Sofro com o sacrifício que tu fazes para te levantar e deitar, para ires simplesmente à casa de banho lavar as mãos, tal o cansaço extremo em que te encontras. Outro dos sintomas da Covid-19. 

E a febre que volta sempre ao fim do dia.

Durante todo o dia eu ando de um lado para o outro dentro desta casa, sim porque também eu estou proibida de sair à rua durante os catorze dias recomendados. E movo-me acompanhada por uma tristeza tão grande, tão grande por te ver a sofrer. 

Mas, de facto, a fé é tanta que realmente me vai ajudando a passar os dias à espera que melhores. 

Tenho tantas ideias para quando tudo isto passar, nós os dois irmos fazer as nossas saídas, os nossos rituais de domingo ao fim da tarde. 

Que Deus nos ajude e que isto passe depressa para te poder abraçar com toda a força que eu puder. Vou mimar-te muito, muito. 

Que Deus olhe por ti, por nós. 

Que Deus olhe por todas as pessoas que, em todo o mundo  estão na mesma situação.

Descansa e recupera rápido. Não te deixes ir abaixo. Não desanimes. 

Amo te muito. 

Vai tudo acabar bem, acredita. 

Estou aqui para ti. 

E. Soares


Comentários

Mensagens populares deste blogue

O MEU DIA DE ANOS

Nove de novembro, dia dos meus anos.  Para mim um dia igual a tantos outros, não fosse o carinho das mensagens, telefonemas e prendas dos que teimam em não cumprir com o meu pedido de não o fazerem. Todos os anos o repetem, porque estão seguros de que não cumprirei a ameaça de não os aceitar.  A este propósito, e com o objetivo de vos dispor bem, vou contar-vos um episódio, digno de uma comédia, vivido há alguns anos atrás, exatamente no dia dos meus anos, e fruto de uma prenda recebida de um grupo de amigas queridas. Nesse ano, as amigas mais chegadas decidiram acarinhar-me com um voucher de um salão de beleza local, que constava de uma “massagem aromática manual de relaxamento profundo”. Encantada com esta oferta, decidi desfrutar dela no mesmo dia. Se assim pensei, melhor o fiz. Dirigi-me ao salão de beleza, e após os cumprimentos iniciais, conduziram-me à sala onde me tratariam e eu sairia revigorada lá para o fim da tarde. Deitei-me na marquesa com as costas voltadas para cima, co

QUANDO PERCEBES QUE NÃO HÁ VOLTA A DAR

 “A Sra. é tal e qual a minha avozinha. Ela não sai de casa sem os seus adereços. É uma querida, mas muito vaidosa”. É com esta frase que uma jovem técnica me presenteia, enquanto aguarda que eu conclua a tarefa desesperada de tirar os brincos e o colar, cujo fecho teima em não abrir. Eu, a paciente que irá fazer uma radiografia dentária. Ela, a técnica que a fará. Eu, uma mulher madura de 66 anos, convencida, até àquela hora, que em nada os aparentava. Ela uma jovem radiante nos seus 20 e poucos anos de idade. Avozinha? Eu, avozinha e mais ainda, vaidosa…   Reparem que não me comparou à sua avó. Fê-lo em relação à sua avozinha, o que para mim corresponde a bisavó.  Não faço qualquer comentário, mas lembro-me imediatamente do que brinquei com a minha amiga Fernanda, mais velha que eu 3 anos, quando me contou que, após completar os 65 anos de idade, tinha ido comprar o passe mensal para o comboio, e ao querer entregar o cartão de cidadão ao funcionário que a atendia, para que fizesse pr

EU E OS MEUS TÉNIS PARA QUASE TODAS AS OCASIÕES

  Preciso de uns ténis para todas as ocasiões, ou quase todas, é um pensamento que me ocorre, especialmente quando, por não os ter, tenho de usar sapatos de salto, que me fazem sofrer horrores nas ocasiões que a isso obrigam. Tenho ténis de várias formas e cores, mas faltam-me os tais. Aqueles que vês nas páginas de publicidade das revistas de moda, e que pensas que, um dia, se puderes, os vais comprar. É então que na minha última viagem a Lisboa, passo por uma sapataria, e vejo em destaque, exatamente os ténis com que venho a sonhar desde há muito. Paro de imediato, e procuro ler o preço que está num talão muito pequenino, como que meio envergonhado, junto do artigo pelo qual já me apaixonei. Por este preço nem pensar, só se estivesse doida, penso eu, e sigo em frente, apesar de a algum custo. Nos dias seguintes e porque o trajeto me faz passar diariamente pela mesma sapataria, vou vendo que eles continuam no mesmo sítio. Lindos de morrer… penso eu todos os dias. Mas, por aquele preço